sexta-feira, 3 de outubro de 2008
The End...
O Henrique e o Francisco tinham recebido a garantia de que os salários apenas estavam em atraso por motivos administrativos que seriam resolvidos no último dia da semana. A Paula e a Maria ouviram bem e garantem que não há qualquer mal-entendido: sexta-feira de manhã tudo seria liquidado.
"Tudo" é como quem diz... Porque no momento em que pagava "tudo" entrava em incumprimento, porque estava ultrapassado o prazo para o pagamento do salário de Setembro. Sim, porque o salário é inteligentemente pago a uma sexta, vésperas de dois dias inúteis, e só está disponível na conta oito dias depois...
A Inácia assegurou ao Pedro que ouviu muito bem o que a Paula e a Maria sussurravam. Sussurravam porque tinham medo de serem ouvidas pela irmã do patrão ou pela mulher do director. Mesmo assim, a Inácia, com um faro jornalístico apuradíssimo, não quis perder a informação.
Mas o Pedro tem um defeito: não sabe estar calado e fala, fala, fala... Gosta do diz-que-disse, o que não condiz com a sua postura máscula. E assim foi falar com o Alberto, que também desabafou com o Fernando sobre os salários que foram prometidos e não pagos.
Neste mesmo dia, Alberto, Fernando, Pedro, Inácia, Paula, Maria, Francisco e Henrique conseguiram encontrar na galhofa um motivo para regressar ao trabalho: a manchete do Janeiro.
Com as palavras "The End" em grande destaque, numa análise aos comportamentos dos suicidas, e uma imagem de uma corda de enforcamento, o Janeiro parece exibir a sua própria realidade. As cordas caem do céu e trespassam o título do centenário jornal. Parece o último capítulo do Janeiro.
Será uma espécie de mensagem encoberta, vinda do além, para que o Alberto, o Fernando, o Pedro, a Inácia, a Paula, a Maria, o Francisco e o Henrique percebam o chão que pisam? "The End". The First of January is a joke.
quinta-feira, 2 de outubro de 2008
Os bufos
Afinal, segundo o JN, que aproveitou os espirros dos bufos, o Janeiro não termina e a reunião não foi mais do que um vazio, um não-diz-nada do director. Um apelo à paciência de quem não recebe, de quem se recusa a fazer serviços porque não tem dinheiro no bolso para pagar as deslocações da equipa de reportagem do Janeiro (!).
Quem são os bufos? É difícil encontrar um nome, sobretudo para quem acompanha por fora esta paródia e mal conhece (de vista, apenas) quem constrói o Janeiro. Eu arrisco adiantar um nome: são todos os jornalistas, que já estão fartos de ver alargados os limites da vergonha.
terça-feira, 30 de setembro de 2008
Novos limites
segunda-feira, 15 de setembro de 2008
Mudam-se os tempos, mantêm-se as vontades
Eu sempre respeitei os vizinhos de cima e não deixo de os respeitar só porque se sentaram na minha cadeira. Perdi o lugar. Não mo roubaram. Eles sentam-se na cadeira e agitam os dedos. Escolhem as letras. Esse exercício quase inútil de reanimar um morto não merece, sequer, a recompensa salarial.
Mudam-se os tempos, mantêm-se as vontades. O Janeiro merecia morrer sossegado.
sexta-feira, 15 de agosto de 2008
Os vizinhos de cima
Não me apetece ler o novo Janeiro para comparar com o genuíno, porque a minha análise corre o risco de ser preconceituosa. E não quero apontar pistolas a quem, afinal, é colega de profissão, um colega de profissão que, também afinal, luta pela sobrevivência.
O actual Janeiro é escrito por jornalistas-bomba, que carregam à cintura um envelope com carta de despedimento, pronto a rebentar a qualquer altura. Eles não sabem, porque não querem ver, que o despedimento colectivo à moda de Eduardo Costa não foi fruto do acaso: é um modus faciendi de uma administração corrupta e desonesta.
O seu emprego está preso por fios, porque foram chamados para apagar fogos num momento difícil do mais do que centenário jornal. Podem olhar a redacção genuína do Janeiro e imaginar um espelho, a sua própria sentença, que ainda não transitou em julgado.
Habituei-me a respeitar os 'vizinhos de cima'. Eles escreviam para ninguém, num jornal sem leitores, sem qualidade, sem ponta por onde se pegasse. Nunca compreendi a razão de ser daquele Norte Desportivo. Talvez fosse um modo de segurar uma redacção para que esta pudesse acudir quando uma genuína fosse desrespeitada. Talvez.
Os 'vizinhos de cima', segundo as minhas pesquisas, são um grupo de jornalistas que começou a carreira naquele jornal. Acabados de sair da faculdade, passaram a receber ordens de pessoas que, segundo sei, não tinham formação na área do jornalismo. Segundo 'fontes oficiais', os bagos foram caindo da uva, porque as condições de trabalho não eram convidativas (alguns nunca tiveram contrato, outros continuam sem contrato), ou porque perceberam que escreviam palavras levadas pelo vento.
Sempre olhei os 'vizinhos de cima' com estima. Eram (e são) jovens, queriam crescer na profissão. Mas o talento que eventualmente têm perdeu-se ou encurralou-se nos vícios de quem não faz a menor ideia do que é o jornalismo, do que é motivar uma equipa, do que é respeitar, do que é olhar nos olhos. Talvez uma aulas com um treinador de futebol fossem frutuosas. Quem sabe?
Os vizinhos de cima, afinal, esmagaram-nos. Foram carne para o canhão que nos devastou. Eles não são culpados. São vítimas. O nosso presente é o seu futuro. A uva quase não tem bagos. Aqueles seres que nunca estudaram jornalismo lideram hoje o Primeiro de Janeiro. Não me apetece ler esse Janeiro. Todas as palavras já foram ditas.
terça-feira, 12 de agosto de 2008
Notas soltas
in Diário de Notícias
Contra-ofensiva: http://www.pai.pt/search/Sedico.html
segunda-feira, 11 de agosto de 2008
PS quer «castigar exemplarmente» as ilegalidades
O parlamentar, que é o coordenador dos deputados socialistas eleitos pelo Porto, pediu às autoridades competentes, que fiscalizem a forma como os jornalistas foram despedidos.
Fernando Jesus apela «a todas as entidades públicas com responsabilidades no cumprimento da legalidade, designadamente à Inspecção-Geral do Trabalho, que não deixará de acompanhar este lamentável caso com o interesse e atenção merecidos, tomando as medidas adequadas, visando castigar exemplarmente eventuais desvios à legalidade, garantindo assim o cumprimento das obrigações e salvaguardando todos os direitos dos jornalistas e trabalhadores».
Para o deputado, é «realmente muito doloroso verificar como os proprietários dum jornal com o historial e pergaminhos deste matutino, por razões ainda não totalmente esclarecidas, têm o despudor de tratar os seus trabalhadores com atitudes que atentam contra todos os valores da dignidade humana».
Segundo Fernando Jesus, os proprietários do jornal «acabam de manchar de forma indelével o nome e o prestígio que o Janeiro granjeou ao longo de mais de um século no panorama da imprensa portuguesa».
in Portugal Diário
Palavra de Pacheco Pereira
José Pacheco Pereira, in Abrupto
A prostituição
Os caminhos da Comunicação Social perderam o sentido. Fala-se da era da Comunicação e a Internet veio aprofundar essa lógica, permitindo a veiculação de mensagens à velocidade da luz. A invenção de Gutemberg (os tipos móveis de chumbo fundido, que conduziram a um avanço nos trabalhos impressos e sua massificação) parece hoje pouco relevante. Parece.
As palavras multiplicam-se, as notícias viajam mais rápidas do que a luz, mas, paradoxalmente, o papel dos jornalistas perdeu a essência. Na era da Comunicação, esses profissionais chegam a vestir a pele de fantoches ao serviço de estratégias de marketing. O poder que conquistaram perdeu-se. São subjugados. Dominados. As entrevistas vendem-se. As palavras passam pela censura dos 'interesses editoriais', esse lápis azul encapuzado. E calam-se.
Outrora respeitado e até venerado, o jornalista é, nos dias que correm, e feitas as óbvias excepções, um soldado ao serviço de outros interesses que não os de informar. A medíocre missão de arrancar palavras a Cristiano Ronaldo é uma das imagens mais ridículas das transformações no exercício desta profissão.
Os caminhos trilhados pelo jornalismo são culpa dos seus actores. Que classe? Existe classe? Que solidariedade? Por que não se gerou um movimento nacional de jornalistas que apoie uma redacção despedida de forma ilegal?
Esta medida da administração da empresa detentora de O Primeiro de Janeiro é baseada em contornos maquiavélicos. Sentaram-se à mesa e lançaram o desafio: “Como nos vamos livrar desta gente?” Ouviram-se propostas, escolheu-se o timing (Agosto é um bom mês, para evitar grandes ruídos políticos…) e fez-se o normal: procurar um buraco na lei que obrigue o Tribunal a dar razão aos oportunistas.
E quem se mexe para erradicar a ‘prostituição’ das redacções, a selvagem lei da sobrevivência, que permite às administrações lidar com os seus fantoches? A competência é um critério? Ou dirige quem ‘dá a pata’? As vozes dissonantes são silenciadas? Os silêncios calam a ilegalidade? Os pontos de interrogação poderiam ser substituídos por pontos finais?
O jornalista já não é o detector de notícias. As notícias chegam às redacções através das agências. As notícias são compradas. Notícias low-cost. Onde está o jornalismo de investigação? Onde está o furo jornalístico, a cacha? Talvez esta seja uma visão pessimista. Mas não se pode esperar muito mais de Alguém que escreve que a invenção de Gutemberg parece hoje pouco relevante…
domingo, 10 de agosto de 2008
O que diria Camilo?
Esta 'introdução-conclusão' surge na sequência de uma tentativa de perceber a história de O Primeiro de Janeiro, de perceber o passado e pensar no futuro deste jornal. Os tempos mudam, processo que destrói o corpo e a alma. Tudo, excepto as memórias. Essas ninguém apaga - sobrevivem enquanto há esperança.
Camilo Castelo Branco, Alberto Pimentel, Guilherme de Azevedo, Guerra Junqueiro, Latino Coelho, Ramalho Ortigão, Antero de Quental, Oliveira Martins, Eça de Queirós, Gomes Leal e António Nobre fazem parte das memórias da cidade do Porto. Em comum, o facto de terem sido depositários de palavras em O Primeiro de Janeiro.
Esse Janeiro subsiste apenas nas memórias. Que caminhos trilhou o matutino, ao longo de 140 anos, até chegar ao presente? O que diria Camilo deste Janeiro? Que prosa seria Eça? Que realidade Nobre encontraríamos? Quem é o pai desta Guerra?
Ao longo dos tempos, O Primeiro de Janeiro foi morrendo lentamente. Morrendo, mas sempre respirando, exalando o ar da sua história. Esse era o seu maior mérito. Hoje, este jornal vegeta, nas mãos do saber de um 'desnorte portivo'. Regicídio. O rei caiu nas mãos da plebe.
É tempo de Regeneração, dizem... Afinal, O Primeiro de Janeiro deve o nome às manifestações da Janeirinha, que a 1 de Janeiro de 1868 iniciaram o processo que levou ao fim da... Regeneração. Que irónico é o destino, que estranho é o passado...
Por isso, "perceber e perspectivar as transformações da existência é um raciocínio ilógico, inócuo, despropositado, dispensável".
terça-feira, 5 de agosto de 2008
Os inevitáveis contornos políticos...
Ou seja, um dos homens que mais burlas cometeu no nosso Estadozinho tem direito a fundos europeus... Ao mesmo tempo, as suas empresas estão em processo de falência. No entanto, tem novos projectos - como o rejuvenescido Janeiro, com maior tiragem do que leitores. Ainda assim, despede funcionários... Fundos, falências, novos projectos, despedimentos. Alguém falou em incoerências?
O Bloco de Esquerda também promete apoiar as vítimas desta jogada à Eduardo. Para os mais distraídos, a jogada é de mestre... A empresa titular do Primeiro de Janeiro está mergulhada em dívidas. Mas encerrar o histórico jornal (marca com força na cidade) seria um erro e desvalorizaria o título.
Solução: encerra-se a empresa titular do Janeiro e outra empresa passa a construir cada edição. Um pacote de jornalistas vai para a rua (por lá permanecem) e um grupo de outros profissionais "herda" o projecto (respeitemos quem prossegue o seu trabalho, agora em novas funções, mas ainda com os salários em atraso, segundo consta...).
Este golaço de Eduardo pode no entanto ser anulado... O Norte Desportivo poderá até desenvolver este tema... Será que o golo é limpo? E que tal entrevistar um responsável qualquer de arbitragem do futebol? Numa altura em que pedir pareceres a juristas é moda...
Os direitos de quem estava nos quadros do Janeiro, afinal, eram mito. Talvez os jornalistas que prosseguem a vegetar naquela casa devessem aproximar-se das portas do verdadeiro Janeiro, olhar os ex-jornalistas deste matutino e anteciparem o futuro, o seu próprio destino. E que tal olharem para eles e imaginarem-se em frente a um espelho?
Enfim... Assim prosseguimos nos limites da vergonha.
segunda-feira, 4 de agosto de 2008
Honra forjada
Num dia, os jornalistas, com salários em atraso (vergonha escondida com convites ao despedimento), escreviam aquelas que – mais tarde viriam a saber – seriam as suas derradeiras peças para a publicação do histórico jornal portuense.
No dia seguinte, eram informados de que estavam despedidos, sem que lhes fosse entregue a carta de despedimento, sem que a lei fosse respeitada, sem que o respeito por profissionais com mais de uma década de dedicação fosse tido em consideração.
Trata-se de mais uma manobra vergonhosa de uma Administração que adoptou a ilegalidade como seu estilo de vida. Ilegalidade praticada por debaixo dos olhos das autoridades, que fingem não ver.
Sentença sem direito a recurso? É a hora do tudo ou nada. É hora de saber quais são os limites da impunidade.
Seria fastidioso enumerar os capítulos da fraude que pauta as estratégias desta Administração. Como exemplos, a contratação de profissionais brasileiras para a área comercial, transformando-as em prostitutas, até que estas percebiam qual a sua verdadeira ‘profissão’.
Não menos célebre (‘célebre’ para quem não fecha os olhos) é caso da fraude do porte-pago, sistema que roubou o Estado, com falsos envios de jornais para receber os benefícios estatais: um funcionário dos Correios procedia a um envio-fantasma de jornais para assinantes-fantasma...
Estes dois estratagemas acabam por transformar este despedimento colectivo da redacção de o Primeiro de Janeiro num simples arranhão de um gato amestrado. Mas este arranhão coloca no desemprego 30 membros de famílias.
As conhecidas dificuldades das empresas são compreensivas, tão compreensiva como a necessidade de encurtar os quadros. Mas o modo como se ‘resolveu’ o problema do mar de dívidas do ‘Janeiro’ foi hediondo: sem respeitar a dignidade de profissionais dedicados, enganando-os com um sarcástico ‘Até para a semana’.
‘Até para a Semana’ é o título de um editorial, no qual a directora do ‘Janeiro’ explica esta “reestruturação”. Foi assim que lhe chamaram: “Restruturação”. No dia do derradeiro número antes da “reestruturação”, falava-se no fim do jornal, enganava-se o proletário honrado, sério e humilde com uma promessa de regresso.
Previa-se uma paragem de um mês. Mas o sarcástico ‘Até para a Semana’ cumpriu-se: uma semana depois, o ‘Janeirinho’ regressa, escrito pela redacção de O Norte Desportivo, toda ela com grande experiência nas áreas Política, Económica e Social.
Ao mesmo tempo que a redacção de um desportivo preenchia páginas de um jornal com sentença de morte, 30 jornalistas enfrentavam o destino da vida, proibidos de entrar nas instalações do jornal a que pertencem e com o qual têm contrato. Um segurança ‘trancava’ as portas da vergonha.
Voltamos ao ‘Até para a Semana’, tentando encontrar no riso um agasalho para a revolta: “São difíceis os dias que atravessamos. Mas é na adversidade que sobressai o carácter dos indivíduos. O nosso jornal é forjado na honra, da defesa dos princípios de liberdade, de cidadania, de serviço para com o público, que tão generosamente nos acompanha. (...) Fazemos falta. Temos o nosso espaço nesta geografia de gente (...) que encara as dificuldades como oportunidades de fazer melhor (...). Quantas vezes nos querem fazer invisíveis. Mas nós existimos”.
“A todos, amigos, colaboradores, assinantes, anunciantes e leitores, que nos têm acompanhado e por nós esperam, um obrigado do tamanho que não cabe nestas linhas. A todos estendemos as mãos. De todos recebemos abraços. A todos até para a semana”, diz o editorial da FALTA DE VERGONHA.
Quem abraça esta gente? Quem lhes estende a mão? Que amigos? Que existência? Que visibilidade? Que falta fazem? Que generosidade? Que cidadania? Do editorial da vergonha, só uma verdade: honra forjada.
Os profissionais do Norte Desportivo foram chamados a apagar os fogos... Eles são experientes nesta matéria, porque desde que este jornal renasceu, foram engolidos pelas chamas.
O Norte Desportivo é um projecto falhado, uma ausência de ideias e de conteúdos, uma máquina de lavar dinheiro, que vive à custa de receitas... inexistentes. Um jornal sem tiragem, sem publicidade, sem leitores. Também, nesta subpublicação, “ilegalidade” é palavra de ordem.
Os jornalistas sem contrato são obrigados a refugiar-se no café Leblon (próximo da redacção) quando os inspectores de trabalho fingem que fazem o seu trabalho. O verbo ‘fingir’ aplica-se porque a lei não é cumprida.
Os profissionais do Norte Desportivo também são vítimas. Têm salários em atraso e estão proibidos de pronunciar certas palavras. Calam no silêncio a ira que sentem, porque a alternativa é o desemprego. Aguardam pela remuneração do seu empenho, desesperam pela constante insensibilidade.
São eles que “na adversidade” terão de fazer sobressair “o carácter dos indivíduos”... O Janeiro, que regressa às bancas com o lema de sempre – “Todos os dias, há 140 anos” – caminha para o fim. Devagar, mas sem recuos.